O real dever da igreja
As afirmações feitas na seção anterior podem chocar os ouvidos dos cristãos modernos, familiarizados que estão com os constantes apelos da Missão Integral, mas a verdade é que Deus jamais colocou sobre os ombros da comunidade da fé a tarefa de melhorar o mundo por meio de programas sociais ou obras assistenciais.
Absolutamente nada na Bíblia ensina ou mesmo sugere isso. Israel, o povo da aliança, nunca recebeu essa incumbência em face das nações a quem deveria anunciar o Deus verdadeiro e as igrejas neotestamentárias jamais foram instadas a isso.
Há quem diga que as mensagens dos profetas do AT era centrada em apelos sociais e que a igreja deve acolhê-las também nesse aspecto. Porém, essa percepção está equivocada. Ainda que condenassem os pecados sociais de seus contemporâneos, os profetas não viam isso como sua preocupação central, mas sim como evidências adicionais de que o povo havia abandonado os preceitos da aliança com Javé. O centro de suas denúncias era, na verdade, a apostasia religiosa da nação. Por isso, na visão dos profetas, a solução para as injustiças que tanto atacavam era o arrependimento e não a implementação de programas assistenciais.
Por isso, é errado dizer que os profetas eram reformadores sociais urbanos e que a igreja precisa ouvir suas mensagens como uma espécie de voz dos oprimidos. Na verdade, a única tarefa que cabe à igreja diante do mundo é pregar o evangelho da cruz, o evangelho do Deus verdadeiro que dá salvação eterna e completa. Esse evangelho, quando acolhido por alguém por meio da fé, acaba por enobrecer a pessoa, tirando-a da ignorância, da vadiagem, da sujeira, das más companhias, dos vícios e da criminalidade.
Vê-se, assim, que o real convertido sofre e promove um impacto que se faz sentir não apenas na sua vida espiritual, mas também no seu trabalho, nas suas escolhas políticas, na sua avaliação do direito e das leis, nas suas concepções éticas, no seu comportamento moral, na sua visão e prática econômica e na importância que passa a dar à educação.
O indivíduo transformado pela fé também começa a agir em prol do seu semelhante (especialmente seus familiares e irmãos em Cristo), não movido por conceitos marxistas ou por tendências político-filosóficas, mas sim por uma santa inclinação que passa a ter como criatura nova (2Co 5.17). Ele é o homem que furtava mas agora não furta mais, antes trabalha para socorrer o que tem necessidade (Ef 4.28).
Todo esse impacto social do evangelho não é, contudo, o alvo final do trabalho da igreja diante do mundo que a cerca. É “apenas” o efeito transformador comum que o Espírito Santo opera no homem salvo. Mais uma vez: o alvo supremo da igreja diante dos perdidos é tentar livrá-los da condenação do pecado, mostrando que a única forma de se protegerem da ira de Deus é buscando refúgio na cruz de Cristo. Realizando essa tarefa proclamativa, a igreja verá pecadores sendo salvos do inferno e, como um “bônus”, os verá também sendo libertos de inúmeras outras formas de opressão, inclusive a social.
Note-se que o evangelho de Cristo sempre produziu esse efeito magnífico, basta observar a mudança de vida de incontáveis indivíduos alcançados pela graça salvadora no decorrer da história; basta também olhar para os inúmeros hospitais, creches, escolas e abrigos fundados por cristãos ao longo dos séculos, muito antes de surgir qualquer proposta liberal ou de “missão integral”. Isso tudo mostra quão desnecessários são os apelos demagógicos desses movimentos e leva a suspeitar que se tratam apenas de artifícios para transformar a igreja numa aliada na promoção de doutrinas heréticas e ideologias de esquerda, sob o disfarce de serva de Cristo.
Por isso, se a igreja quer realmente causar impacto no mundo, concentre seus esforços na pregação do evangelho autêntico, destacando a obra de Cristo, o arrependimento, a fé e o livramento do castigo eterno. Isso fará com que ela veja o homem perdido ser liberto da ira vindoura e de muitas desgraças presentes. Se não cumprir essa tarefa, não verá nem uma coisa nem outra.