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30 de agosto de 2017

A Carta de Raymundo Nobre

Muitas pessoas estranham o rigor com que os líderes da IBR repudiam doutrinas novas e estranhas. Há quem diga que somos radicais e severos demais. No entanto, a história mostra que no campo doutrinário todo cuidado é pouco. Vejam o relato abaixo. Trata-se de uma carta escrita por um líder da Primeira Igreja Batista em Belém do Pará e publicada em O Jornal Batista de 20 de julho de 1911. A carta mostra os danos que dois falsos mestres causaram àquela igreja há mais de cem anos.


Prezado irmão e relator,

Como sabeis pela correspondência do irmão João Jorge de Oliveira, inserida no número de 20 de abril do corrente, na ausência de nosso mui estimado irmão missionário Eurico A. Nelson, ficou o abaixo assinado como encarregado do trabalho de evangelização desta igreja e da do Castanhal.


Devo dizer-vos que os cultos internos e externos desta igreja iam sempre em progresso, pois eram bem frequentados e com bastante atenção; e sem que houvesse oposição de pessoa alguma, a igreja trabalhava em perfeita paz com Deus.


Porém, pela experiência de dezoito séculos pela qual tem passado a igreja do Senhor, sabemos que exatamente quando elas vão mais prósperas é que Satanás se introduz manhosa e sorrateiramente dentro delas procurando aniquilá-las.


Deveras o último assalto que Satanás fez à igreja do Senhor aqui foi o mais astuto e perigoso de todos.


O caso é que há uns cinco meses, chegaram aqui, da América do Norte, dois homens suecos que se diziam mensageiros do evangelho; e antes de bem conhecermos tais pessoas conseguiram elas captar a simpatia dos irmãos J. J. de Oliveira e Eurico A. Nelson, apresentando-se-lhes muito desejosos de trabalharem para o progresso da causa do Senhor neste lugar. Na sua boa fé, os ditos irmãos Oliveira e Nelson apresentaram os tais indivíduos à igreja que, naturalmente, com tão boa apresentação, logo os recebeu sob a condição de eles trazerem as cartas demissórias das igrejas a que pertenciam, cartas que, afinal, nunca chegaram. Logo que estes homens começaram a falar o nosso idioma, começaram a vender Bíblias e, de casa em casa dos crentes, iam fazendo orações, lendo alguns trechos da Bíblia concernentes ao dia de Pentecostes, a Cornélio, etc. Pediam também que os crentes se unissem em oração com eles assim que acabava o culto público, etc. Com estas e outras artimanhas foram ganhando os corações de muitos crentes, como fizera o príncipe Absalão (2Sm 15).


Começaram também a reunir-se em casa de uma irmã cujo marido é marítimo, não se achando em casa. Depois de cinco dias de orações e jejuns correu rapidamente a notícia de que aquela irmã havia sido batizada com o Espírito Santo e com fogo do céu e que, como prova, lhe tinha sido concedido o dom de falar diversas línguas.   


Sendo isto para nós muito estranho, logo depois do nosso culto de quinta-feira, 8 do corrente, dirigimo-nos, eu e diversos irmãos, para o bairro da cidade velha onde mora a referida irmã e, ao entrarmos em sua casa, fiquei deveras surpreendido como em tempo nenhum! Vi aquela irmã, que é brasileira, tendo os joelhos no soalho, as mãos postas na fronte bem erguida e olhos fechados, articulando com rapidez sons que ninguém podia harmonizar e entender, nem sabemos se aquilo era qualquer linguagem. Na  mesma ocasião, muitos outros de joelhos, choravam uns, outros oravam, outros cantavam e outros liam. De repente uma irmã começou a tremer, como se sofresse de maleitas, a gemer até que ficou sem sentidos; seguindo-se a esta crise outra, na qual ora cantava hinos, ora modinhas, inclusive o tango. A este momento diziam, suscitara-se um debate entre os dois espíritos que tomavam conta das pessoas; a primeira pessoa que tinha o espírito dizia que tinha o dom de discernir espíritos e por isso conhecia que o outro espírito era o de Belzebu; enquanto a outra respondia, ora dizendo que era mesmo o espírito de Lúcifer, ora que era de Cristo. Esta cena revoltante durou três horas; depois do que cada um foi para sua casa. Creio que, como eu, muitos do que comigo a presenciaram não dormiram naquela noite.


No dia seguinte houve um culto externo, onde por mandado de um dos tais doutrinadores, um espírito se manifestou numa das duas pessoas mencionadas. Fiquei deveras envergonhado de semelhante escândalo público; mas não me achei com coragem de me opor para não fazer ainda maior confusão aos incrédulos. Logo que o culto findou eles convidaram uns crentes para o templo de nossa igreja. O que então se deu é indescritível. As quatro pessoas actuadas cantavam, riam, choravam. Todos os outros irmãos que se achavam presentes sofriam uma agonia terrível. Até que não pude suportar mais; levantei-me e fiz sinal de silêncio e comecei a falar aos crentes sobre os falsos sinais que haveria nos últimos tempos; porém as pessoas actuadas fizeram uma balbúrdia tamanha em cima de mim que por mais que eu gritasse elas mais gritavam; e como não me fosse possível fazer sobressair a minha voz, fui forçado a calar-me e aconselhar aos crentes a se retirarem, no que alguns me atenderam. No dia seguinte, eu e outro irmão, como não sabíamos notícias do irmão Nelson, passamos telegrama para o irmão J. J. de Oliveira e para o irmão pastor do Maranhão, pedindo providências urgentes.


Fui nesse mesmo dia à tarde fazer a pregação na igreja do Castanhal; e voltei no domingo de manhã para pregar aqui na igreja; e tanto na pregação da manhã como na da noite fui rebatido por um adepto da tal heresia. Esta doutrina diabólica ia se alastrando rapidamente e vi que em poucos dias, se não tomássemos posição de verdadeiros crentes batistas, ficaríamos sem igreja batista na capital. Terça-feira 13 do corrente, depois do culto de oração, convoquei a igreja em sessão extraordinária, na qual foram cortados todos quantos se manifestaram adeptos da heresia, sendo o número total dos eliminados 17. Como estamos em tempos trabalhosos, combinei com a igreja termos uma série de conferências e orações que terminaram ontem, as quais, embora pouco concorridas, deram bons resultados. Os crentes se acham novamente prontos para o trabalho.


Sem outro assunto peço a todos os amados do Senhor as suas orações por nós aqui.


Vosso irmão na fé,


Raymundo P. Nobre.


Belém, 19-6-1911. Caixa 361


Diante de um testemunho tão chocante, devemos nos manter sempre atentos, somando ao nosso cuidado as súplicas para que Deus proteja sempre sua preciosa igreja.

pr. marcos granconato

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