“Meu filho, se os maus tentarem seduzi-lo, não ceda! Se disserem: ‘Venha conosco; fiquemos de tocaia para matar alguém, vamos divertir-nos armando emboscada contra quem de nada suspeita! Vamos engoli-los vivos, como a sepultura engole os mortos; vamos destruí-los inteiros, como são destruídos os que descem à cova; acharemos todo tipo de objetos valiosos e encheremos as nossas casas com o que roubarmos; junte-se ao nosso bando; dividiremos em partes iguais tudo o que conseguirmos!’. Meu filho, não vá pela vereda dessa gente! Afaste os pés do caminho que eles seguem, pois os pés deles correm para fazer o mal, estão sempre prontos para derramar sangue” (Pv 1.10-16 NVI).
No livro Odisseia, Homero escreveu sobre as aventuras de Ulisses no retorno à sua terra depois de terminada a guerra contra Troia. Um dos muitos desafios foi atravessar as águas das sereias, as quais podiam encantar marinheiros com sua música. O ouvinte era tomado por um desejo irresistível de se lançar ao mar e acabava morrendo. Por isso, Ulisses, antes de passar por aquela costa, ordenou que os ouvidos de seus marinheiros fossem tampados com cera e pediu para ser amarrado no mastro, proibindo seus subalternos de soltá-lo sob qualquer circunstância. Quando se aproximaram da costa, a música arrebatadora tomou o navio e Ulisses lutou e implorou para ser solto, mas seus homens o amarraram com mais força. Quando deixaram o local, o bom senso de Ulisses retornou, foi solto do mastro e ordenou que os ouvidos dos marinheiros fossem abertos, seguindo viagem rumo a Ítaca.
Esse é um episódio em que Homero abordou o problema da tentação. Salomão fez isso muito tempo antes ao escrever Provérbios 1.10-16 (os vv.17-19 fazem parte dessa argumentação, mas podem ser analisados à parte). Ele inicia o trecho dizendo: “Meu filho, se os maus tentarem seduzi-lo, não ceda!”. Trata-se da intenção do mundo de desviar aqueles que começam a andar no caminho do bem. Assim, ainda que Salomão eduque bem seu filho, ele se preocupa com as pressões do mundo e o avisa sobre os tipos de abordagem que ele devia esperar e para as quais deveria estar preparado. A primeira abordagem é o envolvimento da companhia, representado pelo convite “venha conosco”. Apesar de esse convite muitas vezes parecer inocente, o que há por trás dele, eventualmente, são coisas ruins como “fiquemos de tocaia para matar alguém, vamos divertir-nos armando emboscada contra quem de nada suspeita! Vamos engoli-los vivos, como a sepultura engole os mortos; vamos destruí-los inteiros, como são destruídos os que descem à cova”. Isso quer dizer que nem todos os convites são bons, mesmo que aparentem inocência de início.
A segunda abordagem é a proposta de obter benefícios desejáveis de modo fácil, algo que ele expressa na seguinte proposta: “Acharemos todo tipo de objetos valiosos e encheremos as nossas casas com o que roubarmos; junte-se ao nosso bando; dividiremos em partes iguais tudo o que conseguirmos!”. Para um tolo que anseia por prazeres e posses, esse é um convite tentador. Porém, por mais convidativo que seja tal proposta, o conselho taxativo do sábio é: “Meu filho, não vá pela vereda dessa gente! Afaste os pés do caminho que eles seguem”. Significa que não é possível se enamorar pelos desejos do mundo sem ser afetado negativamente por eles, nem brincar com fogo sem sair queimado. A verdade é que, por mais que os ímpios pareçam amigáveis e atraentes, o que há por trás de muitas propostas interessantes vem de impulsos ruins, sobre os quais Salomão se expressa dizendo que “os pés deles correm para fazer o mal, estão sempre prontos para derramar sangue”. Portanto, tome muito cuidado com os convites que recebe e com a tentação ao redor. Eles podem afogá-lo em meio a doces melodias.