Meditação © Amplo Publications

15 de março de 2016

Um Raro Prazer

Crente fuma? A resposta imediata de todo mundo é: “Nem pensar!”. Realmente, o tabagismo não combina em nada com o que as pessoas esperam ver na vida de um cristão. Dizem que Charles Spurgeon, o grande pregador batista do século 19, fumava charutos, mas essa informação só lhe rende críticas pesadas. Dizem também que, quando alguém se converte, Deus remove prontamente da pessoa qualquer vício, seja o cigarro, a bebida ou as drogas. Aliás, não faltam crentes ex-fumantes que dão testemunho disso. Infelizmente, porém, esse “milagre” não parece ser a regra, pois há várias pessoas que se convertem e continuam lutando com seus velhos vícios.


Independentemente de histórias, testemunhos ou opiniões, a verdade é que a Bíblia não fala nada sobre o cigarro. De fato, é por causa da ausência de base bíblica para condenar esse vício que muitos pastores usam 1Coríntios 6.19 — o texto que diz que o nosso corpo é templo do Espírito Santo — para atacar o tabagismo. Citando essa passagem, muitos pastores dizem que o crente deve cuidar da saúde corporal. Daí concluem que o cigarro é pecado. Curiosamente, o mesmo raciocínio não é aplicado para o consumo de refrigerantes ou para a vida sedentária, ambos também muito prejudiciais à saúde. No fim das contas, quem destrói o corpo ficando sentado o dia inteiro e se empanturrando de coxinha e Coca-Cola pode até ser líder da igreja. Já quem destrói o corpo fumando...


A grande verdade é que usar 1Coríntios 6.19 para afirmar que o crente tem de cuidar da saúde é “papo-furado”. Paulo nunca usa a verdade de que nosso corpo é um templo para defender o dever do crente de zelar pelo seu bem-estar físico. Sem dúvida, ele se preocupava com a saúde de seus irmãos queridos (1Tm 5.23), mas nunca usou o “conceito do corpo-templo” para estimular o cuidado com isso. Na verdade, Paulo ensinou que o corpo do crente é um templo para embasar o seu repúdio à imoralidade — uma classe de desvios em que a pessoa peca contra o próprio corpo (1Co 6.18).


Mesmo, porém, sem ter uma base bíblica que condene diretamente o cigarro, a verdade é que o tabagismo é pecado sim. Isso porque, se, de um lado, o NT não usa o conceito corpo-templo para ensinar o zelo pela saúde, de outro, é inegável que a Bíblia inteira ensina o conceito de mordomia, em que somos instados a cuidar de tudo que o Senhor nos deu. Ora, isso inclui o corpo, fazendo do fumante (e do viciado em poltrona e Coca-Cola) um péssimo mordomo — um administrador reprovado por tratar com desmazelo um organismo formado de modo “assombrosamente maravilhoso” (Sl 139.14).


E tem mais: o “crente fumante” também peca por seu mau testemunho. Por razões históricas que talvez sejam difíceis de rastrear, em nosso país e cultura o tabagismo está fortemente associado ao estilo de vida das pessoas incrédulas, mais especificamente à figura do homem moderno que busca prazer e charme, e também ao perfil da mulher de “mente aberta”, livre de tabus e dona de si. A conexão entre o tabagismo e esses modelos torna o uso do cigarro um problema sério para o homem que se apresenta como cristão. Isso porque ele confundirá a mente dos de fora, levando-os a não entender como, de fato, um crente pensa e vive. Ele também os fará questionar em que aspectos ligados aos pequenos detalhes e costumes da vida o cristão realmente difere dos homens sem Deus.


Isso tudo sem falar no escândalo que um eventual crente fumante poderá causar dentro da comunidade redimida. Com efeito, se um cristão vir seu irmão na fé com um cigarro na boca, quão triste, preocupado e decepcionado ficará! Ora, todas essas reações perfazem o escândalo de que Paulo trata em Romanos 14 e 1Coríntios 8. E Paulo condena o homem que causa esse tipo de escândalo (Rm 14.21; 1Co 8.12). Para o apóstolo, esse assunto era tão sério que ele disse que deixaria de comer carne para sempre, caso soubesse que isso escandalizava alguém (1Co 8.13).


Eis aí, enfim, a forma como os crentes devem ver o problema do tabagismo e de outras práticas fortemente conectadas ao modo de vida dos incrédulos. Com certeza, o servo de Jesus que se afastar delas prestará um bom serviço à causa do Mestre, poupará sua igreja de tristes escândalos e viverá uma vida livre de pesos e segredos, honrando ao Senhor com o fogo sem fumaça do bom testemunho — um raro prazer.

pr. marcos Granconato 

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14 de março de 2016